Há algum tempo, alguns amantes do vadeio vem expressando o desejo de visitar o cerrado goiano e conhecer nossas belezas protegidas. Poucos pescadores sabem que, no Brasil, um dos melhores pesqueiros para a prática desse estilo de pesca com mosca, encontra-se cravado no solo goiano.
No último fim de semana do mês de março, tivemos uma surpresa agradável: grande parte da equipe GO FLY foi anfitriã dos amigos Kid e Kensuke. Cercado pelo mais puro cerrado, esse encontro marcou para sempre a vida de todos os participantes, estacados pelos mais nobres sentimentos mosqueiros: a amizade e o abraço caloroso à natureza.
Eu, Herik, Vitão, Rafa e o experiente Alencar chegamos a Piri na noite de sexta-feira (26/03/2010), lá recebendo o amigo KID. Kensuke chegaria apenas no outro dia cedo (sábado). Fomos ao centro histórico da cidade das pedras para confraternizar, apreciar um aperitivo e jantar. Após o bom papo e muitas risadas traçamos a estratégia de vadeio do dia seguinte. Pelas condições de chuva, em plena enchente de São José, as cabeceiras de rio protegidas por colinas rochosas permanece mais limpas, mesmo com as chuvas, permitindo, assim, o vadeio.
A noite foi de muita garoa e o dia amanheceu com muita neblina. Apesar do clima, o entusiasmo dos mosqueiros era total. Herik, Vitão, Rafa e Alencar partiriam às 6:00 hs para tentar as pirapitingas e lambaris exóticos. Enquanto isso, eu e o KID aguardávamos a chegada do amigo Kensuke às 9:20 hs para só então irmos pescar. Quando encontramos Kensuke, minha mochila já estava abastecida com nossas refeições do dia.
Foi muito bom conhecer o amigo Kensuke e ver a sua disposição, vindo de tão longe (Rio de Janeiro) para conhecer a equipe GO FLY e o vadeio pelas áreas de instalação do Projeto Pirapitinga-do-Sul.
Partimos direto para o rio para tentar algumas pirapitingas. Pesquei com equipo 3, enquanto Kid e Kensuke usavam 2 e 4, respectivamente. Utilizei um leader cônico montado de 9’ de comprimento, com tippet 0,20 mm de composição mista (fluocarbon/nylon).
Mesmo não sendo o preferível, acabamos optando por descer o rio, já que o rio estava um pouco cheio e veloz, o que dificultaria o upstream, uma fez que a correnteza é bem forte e suas margens quase não permitem a caminhada.
Logo nos primeiros passos uma pequena pirapitinga deu as caras na minha Royal Wulff. Isso foi um bom sinal para saber que a desova de dezembro foi efetiva e as jovens pirapitingas estão espertas e sadias.
Pirapitinga de aproximadamente 100 dias
Ainda pela manhã o amigo Kid teve uma grande luta com uma boa pirapitinga. Mesmo conhecendo a força dos grandes peixes, como o tucunaré, o tarpon e o dourado, Kid se rendeu a magia da pirapitinga, aflorando gritos e vibrações que contagiou os colegas. Enquanto Kensuke filmava toda a cena, corri com meu net para apanhar a pirapitinga. Depois de tomar um drible daquele Brycon, encestei a danada. Após abraços e comemorações percebemos que a pirapitinga não estava mais no puçá, pois havia escapado por um furo em sua rede. Foi um baque total da equipe, me senti triste e responsável por aquela perda, pois nem mesmo pude fotografar a linda pirapitinga ao lado do amigo Kid que fazia sua estréia com aquela espécie. Ainda bem que Kid e kensuke me confortaram com a frase “caugth and released”.
Kid e pirapitinga em ação
Depois de superar a frustração da perda continuamos o vadeio e logo abaixo a vara de bambu #4 (by Beto Saldanha) do amigo Kensuke vergou inteira na batalha com uma bela pirapitinga. Devidamente fotografada e apreciada, a danada voltou para água com muita saúde.
Brincamos um pouco com os “lambaris enferrujados” que atacavam ferozmente nossas dry flies (anzol 16-18). Já com o sol alto as ações das pirapitingas desapareceram, mesmo com boas apresentações e constantes trocas das moscas. Só no fim de tarde que fisguei mais uma pirapitinga.
A paisagem estonteante e a observação dos insetos aquáticos e terrestres nos distraíram e recompensaram a falta de ações.
Passamos pelo encontro com o rio São João, cercados por belas montanhas e cânions escorregadios. Ao final do dia ainda pegamos uma forte e passageira chuva, mas logo depois o sol incandesceu.
Foram 6 km de caminhada em pedras energizadas pelo espírito aventureiro dos mosqueiros.
Hellgramite, ninfa da Dobsonfly.
Mina d'água
Após o término do primeiro dia de pescaria, retornamos à casa em Piri e encontramos o outro grupo de mosqueiros felizes da vida, satisfeitos, com mais de 30 lambaris-largos (Astyanax elachyleps) capturados. A alegria já era de se esperar, pois o “Largo” não é qualquer lambari, é simplesmente o maior dos lambaris. O largo é robusto, forte, ataca muito bem as moscas secas, proporcionando uma boa briga com equipamento levíssimo.
Depois do jantar, muito papo de mosqueiro e histórias fabulosas! Os amigos Kid e Kensuke demonstraram muito conhecimento técnico e nos contaram um pouco de suas experiências vividas, o que contribuiu para o aprendizado de todos. E como sempre o Alencar zoando com todos da turma. Não perdoou ninguém. Apesar dos seus anos de experiência, parece que ainda é um menino! O Rafa, pra acalmar o seu vício, ainda atou algumas ninfas antes de dormir.
A noite chuvosa não desanimou os mosqueiros. Eu, Kid e Vitão fizemos novamente o mesmo percurso do dia anterior, enquanto Kensuke fora guiado pelo grupo do Rafa, Herik e Alencar em outro trecho mais curto, abaixo do nosso.
Ao chegar vimos que o rio havia subido e que sua água estava ainda mais escura. Como era de se esperar as ações foram mínimas, apenas o Vitão – também debutante na pescaria da pirapitinga – brigou com um exemplar no poço da cachoeira Araras, mas foi perdida. Neste tipo de pesca, o peixe sempre está na vantagem.
Mesmo sem peixes na linha descemos o rio casteando e afinando nossa técnica. Histórias incríveis foram criadas, até a lenda do “Pirinopanda” foi inventada. Essa eu vou deixar para o Vitão e Kid contarem.
Quando voltamos pra casa, Kensuke já havia partido de Piri. Rafa nos contou que o nosso convidado ficara muito satisfeito com a captura de uma boa pirapitinga e com os vários lambaris: largos; saltadores (Bryconops caudomaculatus) e de ferrão (Jupiaba apenima). Todos estes com mosca seca. Sem falar que ainda lutou com duas boas pirapitingas que quebraram seu tippet.
Usando todas as suas artimanhas de anos de vadeio, Kensuke se mostrou muito inteligente ao saber utilizar técnicas variadas apropriadas para cada ocasião específica, como o lastreio do tippet em locais profundos e turbulentos. Vimos, mais uma vez, o quanto a pirapitinga gosta da água “brava”.
Rafa também foi presenteado com uma boa pirapitinga:
Herik e Alencar também vergaram suas varas leves com os lambaris-largos. Como diria o amigo Rafa: “foi cada lambari-largo de encher a mão!”.
KID Ocelos e Kensuke Matsumoto serão para sempre lembrados pela equipe GO FLY. Com simplicidade, carisma e técnica deixaram sua marca em nosso paraíso preservado. Foram companhias agradabilíssimas e enfrentaram muito bem o desafio de capturar a pirapitinga no cerradão goiano em plena enchente de São José.
Todos estão de parabéns pelo coleguismo e pela sincera amizade que pudemos compartilhar!
Até a próxima caminhada
GO FLY !!!
Dica técnica para montagem do líder:
A linha de fluocarbon “pura” reduz muito a sua resistência quando o seu diâmetro é muito baixo, por isso quando for utilizar linhas de fluocarbon < 0,30 mm, para confeccionar o líder, dê preferência por linhas de composição mista (fluocarbon/nylon), pois possuem boa resistência à tensão (nylon) e abrasão (fluocarbon), preservando também a “hidrotransparência” característica do fluocarbon. Uso a linha da marca ASSO, modelo ULTRA.