sábado, 16 de fevereiro de 2013

PESCA NA AMAZÔNIA - GO FLY

Texto: Leandro Vitorino
Fotos: Ian de Sulocki, Jarbas, guias Kalua e Leandro Vitorino
Troféu amazônico (Cichla temensis). Foto: Jarbas


     Minha mãe lavava roupa num açude no interior do Tocantins, próximo da nossa casa, enquanto isso eu observava um velho pescador fisgando lambaris na minhoca e enchendo sua velha capanga de pano, costurada à mão. Percebi o quanto aquele pobre pescador era feliz, ali sozinho, curtindo o seu momento. Eu ficava matutando: quando eu crescer vou querer ser pescador para ter a mesma felicidade desse velho. Escutei uma voz ao fundo ordenando: “menino, ajuda aqui... pega a bacia, vambora que ainda tenho que fazer almoço”- era minha mãe. Aí acordei...Vinte oito anos depois, ali estava eu, no meio da floresta amazônica, subindo o Rio Negro no Barco-Hotel Kalua, em busca dos grandes tucunarés-açús.

Bacia do Rio Negro. Foto: Leandro Vitorino
Um dos milhares de lagos da Bacia do Rio Negro (AM). Foto: Leandro Vitorino
As águas negras bordam as praias de areias brancas. Foto: Leandro Vitorino
Barcelos, a primeira capital do estado do Amazonas. Foto: Leandro Vitorino
Embarcação de um "piabeiro" ao lado do seu viveiro de peixes ornamentais. Foto: Leandro Vitorino
     Pontualmente as 5:30 da manhã batem na porta, acordando os pescadores. Tomamos um saboroso café da manhã, as 6 horas entramos na voadeira, ainda escuro e percorremos alguns quilômetros no Rio Negro até chegar a uma boca de lago... 

Guia Edivan (Kalua) abrindo a entrada do lago. Foto: Leandro Vitorino
Arraias, perigo nas rasuras. Foto: Leandro Vitorino 
    Tira motor, arrasta canoa, corta pau, pisa em espinho, espanta as arraias e enfim... 

O trabalho do guia é fundamental na procura dos Açús. Foto: Leandro Vitorino
  Ali estávamos nós dentro de um lago selvagem totalmente preservado. Depois de tanta preparação técnica, física e mental, não queria que nada saísse errado.

Lagarto amazônico que escala árvores e nada muito bem. Foto: Leandro Vitorino
O nível da água no fim da temporada encontra-se bem baixo. Foto: Leandro Vitorino
Tucunaré Borboleta (Cichla orinocensis). Foto: Ian de Sulocki (Kalua)
     Primeiro vieram os Borboletas e Popocas, misturado as traíras, em pouco tempo sairam os Pacas e com muita insistência e resistência subiram os grandes Açús. A força dos Açus é inigualável aos outros tucunarés, impressionando em suas primeiras arrancadas.

Tucunaré Popoca (Cichla monoculus). Foto: Edivan (Kalua)
Açú
    Utilizei o bait casting e a pesca com mosca como modalidades. A pesca com mosca mais uma vez se mostrou extremamente promissora, valorizando a luta com o peixe e elevando o sabor da conquista. Ao longo de cinco dias inteiros de pesca, saíram inúmeros peixes na mosca, os maiores sempre vindo após muito exercício.



     Vim à Amazônia acreditando que arrancar os grandes açús da água é tarefa fácil é subestimar a própria grandiosidade amazônica. 

Os ataques dos grandes machos de açús são provocados principalmente por irritação, territorialismo e proteção das proles. Foto: Jarbas

Foto: Jarbas
Foto: Jarbas
     Os grandões estão lá, mas é preciso ralação! Os jovens açús possuem um padrão “paca” de cor e à medida que vão amadurecendo passam por um padrão “paca-açú” até alcançar o padrão “açú-adulto”, estando prontos para o acasalamento. A fêmea com padrão “paca-açú” já é capaz de se reproduzir, enquanto aos machos com padrão “paca-açú” eu tenho minhas dúvidas. O fato é que só encontramos machos com cupim no padrão de coloração do adulto, nunca vi um paca com cupim. As fases de maturação do açú assemelham-se as do Tucunaré-azul, que também passam por uma fase “paca” de cor. Os pacas, por serem jovens, mostram muita força e disposição na ponta da linha. Alguns açús possuem um potencial genético tão bom que é possível encontrar pacas acima dos seis quilos. Alguns acreditam que os tucunarés-açús após atingirem seu padrão adulto de cor, podem voltar a apresentar o padrão paca, de forma intermitente, eu não creio que isso aconteça. Mas, saindo do foco científico, vamos voltar a nossa pescaria...
Jovem Açú com seu padrão "paca" de cor. Foto: Ian de Sulocki
Tucunaré Açú em fase de amadurecimento com padrão "paca-açú" de cor. Foto: Jarbas
   Os tucunarés borboletas às vezes formam grandes cardumes e fazem a festa do pescador esportivo. A pintura do Borboleta se contrasta às águas da Bacia do Negro e produzem uma “textura” bem interessante. Os Popocas são bem agressivos e dão um tempero especial à pescaria.

ENCONTRO COM OS AÇÚS

Amigo Jarbas com seu Açú. Foto: Leandro Vitorino
    No primeiro dia de pesca fizemos apenas um aquecimento no final de tarde, calibrando os arremessos e condicionando o cérebro aos movimentos que seriam realizados umas mil vezes por dia, nos próximos cinco dias.

    

O jovem Cichla temensis ("Paca") começa a perder suas pintas da cabeça para o rabo, quando as pintas estão só na metade do corpo são chamados "Paca-açú", quando perdem todas as pintas são chamados de Açú. Foto: Jarbas
    No segundo dia de pesca, consegui por a mão em dois bons tucunarés. No terceiro dia, no finalzinho de tarde, meu companheiro Jarbas persistia nos arremessos, enquanto eu já estava sentado, só apreciando a vista, observando o sol que se acomodava na mata densa. Até parece mentira, mas eu estava sentado, fiz um pincho despretensioso não muito longe do barco e ao recolher senti a linha travar, achei que fosse um enrosco, mas a tomada de linha denunciava um peixe grande... 


Leandro e o guia Edivan comemorando um grande Açú. Fotos: Jarbas
    O freio apertado ao máximo não conseguia conter o peixe rumo às galhadas. As primeiras arrancadas foram bem fortes, até que consegui encabeçá-lo para o fundo, fora das estruturas. A primeira fez que pude ver sua silhueta na superfície fiquei impressionado com seu tamanho e beleza. Ao embarcá-lo o guia Edivan e meu companheiro Jarbas comemoraram juntos comigo o grande Açú que se revelava. Fotografamos e o devolvemos para água bem ativo. 

           Fotos- Jarbas:




    Retornamos ao Kalua bem felizes, para um bom banho, boa comida e um merecido descanso.

Peixe fresco preparado pelos guias. Foto: Leandro Vitorino
Atando no barco. Foto: Jarbas
     Nos dois últimos dias tive a honra de pescar com o Ian. Foi ótimo conhecer uma pessoa de tão bom caráter, muito conhecimento e sempre disposto a compartilhar seu aprendizado após anos vividos com os Açús. 

Muitas vezes a dificuldade de entrar num lago é sinônimo de bons peixes. Foto: Leandro Vitorino
Trabalho da Hélice. Foto: Leandro Vitorino
Foto: Leandro Vitorino


Pacão. Foto Leandro Vitorino


    No último dia, atingimos a incrível marca de 128 tucunarés capturados em apenas um dia de pesca, fora os outros peixes de outras espécies. Foi o dia de maior produtividade que já tive em toda minha vida, o que para o Ian era um fato rotineiro.

Ian e eu explorando um lago em que a embarcação não chegava. Foto: Edivan
Paca e borboleta num lago fechado. Foto: Edivan



As bocas de comunicação entre o rio e os lagos fornecem muitas presas aos tucunarés, mas quando esses lagos perdem a sua comunicação com o rio essa fonte de alimento é cortada, fazendo os tucunarés ficarem "famintos", possibilitando inúmeras capturas. Foto: Ian
T. Borboleta na mosca. Foto: Edivan


UM POUCO DA FAUNA LOCAL:

Jacaré-Açú. Foto: Leandro Vitorino
Cabeça-seca. Foto: Leandro Vitorino

Louva - Deus. Foto: Leandro Vitorino
Tucurão verde. Foto: Leandro Vitorino
Tucurão. Foto: Leandro Vitorino
VOLTANDO À PESCA: 

Entrando em mais um lago. Foto: Leandro Vitorino
Boa estrutura para arremessos. Foto: Leandro Vitorino
    

Açuzão explodindo na hélice. Foto: Ian

Foto: Ian

Apaiari na mosca = força desproporcional ao tamanho. Foto: Ian

Paca-açú na mosca, boa resistência. Foto: Ian de Sulocki

    Foi uma experiência muito gratificante pescar na Amazônia, conhecer um pouco dos seus animais e como as pessoas que ali vivem se adaptaram à selva. A convivência do homem na Amazônia gerou uma cultura regional de extrema riqueza, na qual índios e mestiços aprendem a respeitar as forças da natureza, moldando um misticismo próprio, que envolve e alimenta a alma do ribeirinho amazonense.

Ian com um legítimo Açú. Foto: Leandro Vitorino



O territorialismo motiva mais os grandes machos de açú ao ataque do que a própria vontade de comer. Foto: Ian de Sulocki

Foto: Ian de Sulocki

Foto: Ian de Sulocki

     Quero deixar meus agradecimentos ao Ian, ao Mega e toda a tripulação do Kalua Barco-Hotel, que com bastante boa vontade e competência, nos colocaram num dos melhores pontos de pesca da Amazônia. Obrigado companheiros de viagem que também somaram novas amizades. Ao Kelven, muito obrigado pelo empréstimo de equipamentos de baitcasting e dicas.

Espero voltar em breve...

O império dos Açús. Foto: Leandro Vitorino


EQUIPAMENTOS:

       FLY CASTING (que recomendo):

A)    Varas de #9 à #12 de ação rápida, com 9 à 10 pés de comprimento. Considero que as moscas maiores selecionam os tucunarés maiores, exigindo assim um equipamento mais forte.

B)    Moscas: 
Moscas que recomendo. Foto: Leandro Vitorino
           As duas moscas que mais me renderam bons resultados foram os poppers e um Streamer listrado muito especial: é um streamer com cauda de EP, bucktail e brilho, corpo com Craft-fur e EP sparkle, com cabeça tipo “muddler” de EP e olhos 3D. Um anzol 2/0 é mais do que suficiente pra segurar qualquer Açú, mas utilizei o 3/0 (SP 600 da Tiemco), pois seu maior peso dava um maior lastreamento a mosca, além de gerar um maior equilíbrio, evitando que a mosca gire durante as puxadas, algo que pode acontecer se você atar uma mosca com cabeça muddler de EP utilizando um anzol leve.


     
    C) Leader: um único pedaço de 1,2m de fluocarbon 0,60 mm foi o que mais achei adequado para a situação, facilitou meus arremessos e preservou uma boa quantidade de energia até as moscas pesadas que utilizei. O fluocarbon afunda mais que o nylon, além de possuir uma boa transparência. O fluocarbon tem um poder de abrasão melhor que o nylon, como todos sabem, porém possui uma resistência à tensão menor que o nylon, o que de certa forma acaba protegendo seu equipamento caso o peixe coloque sua linha de fly no limite de tensão, fato que ocorre quando impedimos o Açú de nadar rumo às galhadas.


      D) Linha: utilizei apenas linhas flutuantes com cabeça curta, mas credito que as linhas intermediate também farão um bom papel.

BAITCASTING (o que utilizei):

Varas de 25 libras, de ação rápida;
Linhas de multifilamento de 60 libras;
Leader de fluocarbon 0,52 mm, com 1,2m de comprimento;
Grampo (Snaps) reforçados;
Iscas: Zaras, hélices, tuich bait, meia-água e jigs de 30-40 gramas.